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Um é bom, dois é ótimo e três não é demais!

Jaqueline Wichineski Santos
Advogada, Pós-graduada em Direito Civil e Processo Civil

O Estado, no âmbito das leis, não pode impossibilitar o reconhecimento das realidades familiares atuais da sociedade, em constante mudança em suas relações socioafetivas. É contra princípio constitucional à dignidade da pessoa humana, que compreende entre outros a liberdade de objetivos próprios de vida.

O conceito tradicional de entidades familiares se alterou com o passar dos anos, porém em algumas situações passam despercebidas, ficando presos a modelos pré-concebidos, conhecidos como famílias tradicionais.

Até pouco tempo atrás, um filho era concebido através do sexo entre um homem e uma mulher. Após o advento da engenharia genética, a concepção em laboratório revolucionou vínculos afetivos e jurídicos.

A Multiparentalidade reconhecida, recentemente, no mundo jurídico compreende, além dos vínculos biológicos, também os afetivos parentais, concomitantemente, ou seja, mais de um pai, ou mais de uma mãe (biológico e afetivo).

O legislador não dá conta de responder aos anseios de uma sociedade que necessita ter respostas. Um exemplo é a alteração do registro civil da criança ou adolescente, trazendo mudanças significativas sociais e jurídicas, dando poder familiar, possibilitando, assim, a inclusão de enteados em planos de saúde, viagens e hospedagem em hotéis.

Felizmente, o Supremo Tribunal Federal em 2016 reconheceu a multiparentalidade pelo conceito Constitucional, possibilitando a inclusão da parentalidade socioafetiva, enaltecendo, o direito de buscar a felicidade. Assim afirma que a paternidade socioafetiva não exclui a paternidade biológica, ou seja, a criança terá a possibilidade de ter alterada sua certidão de nascimento e por consequência jurídica, o poder familiar, responsabilidades, direitos sucessórios, etc.

Mas, como fazer para ter o reconhecimento da multiparentalidade? Ajuizar no Poder Judiciário uma ação, que através de um processo possibilitará recursos de equipe especializada tais como psicólogas, assistente social, e demais profissionais capacitados, além do Ministério Público para dar parecer, favorável ou não. O objetivo será sempre voltado para o interesse da criança ou do adolescente.

Surgiram dúvidas quanto à possibilidade de se reconhecer a multiparentalidade através do registro de pessoas naturais, do artigo 14 do Provimento 63 do CNJ, em que foi interpretada pela nota técnica emitida pela Associação Nacional dos Registradores de pessoas naturais (Arpen) em 06/12/2017.

Situação resolvida, posteriormente, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a fim de dar a Interpretação de que as únicas hipóteses administrativas no Cartório de Registro Civil são a da monoparentalidade (registro de um filho somente com o nome da mãe) e a biparentalidade (registro de um filho com o nome de dois genitores), ou seja, o que já era permitido.

Quando se trata de uma situação mais complexa é necessário averiguar, individualmente, cada caso, levando em consideração o melhor para a criança. Durante o processo judicial é possível com a dilação de provas ter mais segurança jurídica desde que com o contraditório e ampla defesa para as partes.

Mas, atenção: faz-se necessário um amadurecimento da relação entre os conviventes, priorizando a criança, pois uma vez reconhecido o direito do vínculo afetivo, seja pelo oficial de registro no cartório, seja no Judiciário, não é algo para se colocar no “papel” apenas, pois, é irrenunciável e irretratável.

A relação dos conviventes precisa ser saudável. O afeto é o principal elemento para o desenvolvimento psicológico, físico e emocional da criança. O mais importante de tudo isso é que ela “não é moeda de troca”, caso o relacionamento não der mais certo!